Decorreu recentemente, em Barcelona, o II Fórum das Alianças Europeias de Universidades, promovido pela Presidência Espanhola da União Europeia, dando continuidade a evento semelhante promovido em 2022 pela Presidência Francesa.
A ideia das universidades europeias foi lançada pelo presidente Emmanuel Macron, em 2017, num discurso feito na Sorbonne, no qual propôs a criação de uma rede de universidades impulsionadoras da inovação educativa e da procura da excelência.
A Estratégia Europeia para as Universidades, adotada pela Comissão Europeia em 2022, estabeleceu que a Iniciativa das Universidades Europeias apoiaria alianças transnacionais de Instituições de Ensino Superior que visassem desenvolver uma cooperação sistémica e sustentável, a longo prazo, em matéria de educação, investigação e inovação, criando campi interuniversitários europeus.
O modo como a ideia inicial de Macron foi apropriada pelos decisores europeus e pelas Instituições de Ensino Superior exprime-se no facto de hoje estarem constituídas 50 Alianças Europeias de Universidades, de 35 países, agregando mais de 400 instituições. O objetivo mais imediato, enunciado pela Comissão Europeia, é que se atinja proximamente o número de 60 alianças, envolvendo 500 universidades.
Num quadro de cooperação interinstitucional já muito intenso, a criação das alianças, envolvendo, em cada caso, nove universidades de diferentes países da União Europeia, veio trazer um elemento adicional de organização e coesão interinstitucional ao espaço europeu, com importantes impactos na internacionalização das universidades.
Por esta via, abrem-se novas possibilidades através da criação de graus europeus conjuntos, do desenvolvimento de projetos de investigação partilhada e da construção de respostas conjuntas aos grandes desafios societais. Nesta medida, as alianças das universidades aspiram a uma efetiva transformação das instituições e do sistema de Ensino Superior, aumentando a qualidade das instituições, com base nos valores europeus, no quadro dos quais a liberdade e integridade académicas têm um papel fundamental.
A abordagem que tem sido feita pelos diversos governos a esta iniciativa tem sido diversa; nos países vizinhos Espanha e França, estão a ser feitas fortes apostas políticas, que se traduzirão num reposicionamento das universidades destes países no panorama europeu do Ensino Superior.
O envolvimento das universidades portuguesas na iniciativa tem sido muito significativo. Em Portugal, há 9 universidades públicas que participam em Alianças Europeias, organizadas em torno de tópicos como inovação e impacto social, desafios da saúde global, inovação e desenvolvimento tecnológico, desafios dos territórios e das sociedades, inovação educativa e novas modalidades de Educação Superior.
Para as universidades portuguesas, não estão em causa apenas motivações reputacionais ou a procura de novas fontes de financiamento; trata-se, antes, de participar num processo transformacional do sistema europeu de universidades; é uma oportunidade para que as nossas instituições se envolvam num processo que, pela exigência que coloca, as tornará melhores e mais internacionalizadas e que, de caminho, contribuirá para o desenvolvimento do ensino superior do nosso país.
A Iniciativa das Universidades Europeias é exigente em matéria de recursos humanos e financeiros. A União Europeia vem, para o efeito, mobilizando recursos com origem em vários dos seus programas. A ambição da iniciativa requer, porém, medidas que assegurem, no médio prazo, a sua sustentabilidade. Há países que assumiram importantes compromissos com as suas instituições que são membros das alianças, reforçando, por vezes significativamente, o financiamento europeu.
Portugal, até agora, não foi além de um programa de bolsas de doutoramento orientado para as universidades participantes na iniciativa. Este facto não permite que as nossas instituições aproveitem em toda a sua extensão as potencialidades das Alianças Europeias. Importa, por isso, encontrar mecanismos que exprimam um efetivo compromisso do país e das instituições com a iniciativa, promovendo-se o alinhamento entre financiamento regional, nacional e europeu.
A Comissão Europeia tem como objetivos a atribuição de “graus europeus” e a atribuição de um estatuto legal próprio às universidades europeias. A simplificação, em curso, no nosso país, da acreditação de cursos criados no âmbito das alianças é um caminho a prosseguir; é fundamental, também, a participação de Portugal na construção do quadro jurídico necessário à criação das universidades europeias.
Numa circunstância que é muito estimulante para o Ensino Superior na Europa, há naturalmente obstáculos a ultrapassar. A existência de diferentes regimes jurídicos nos países da União Europeia é um desafio com que as alianças se confrontam; a convergência entre culturas organizacionais institucionais distintas é, também, um óbice, embora, como a experiência vem mostrando, a diversidade possa constituir-se como importante fator de união; num outro plano, a interiorização pelas nossas comunidades universitárias dos objetivos e das possibilidades abertas pelas alianças europeias é um dos principais desafios a vencer.
Existe, porém, um desafio maior: apenas cerca de 10% das universidades europeias estão envolvidas em alianças de universidades. O risco de uma fratura entre grupos de universidades à escala continental é, pois, real. Nesta circunstância, é essencial prever nos planos nacional e europeu mecanismos de articulação entre quem participa e quem não participa nas universidades europeias.
Apesar deste risco, que deve ser ponderado, o que está em causa é um verdadeiro processo transformacional do Ensino Superior europeu, sem paralelo em nada que tenha acontecido nas três últimas décadas, capaz de tornar as universidades ainda mais envolvidas no desenvolvimento social e económico e mais aptas a responder aos grandes desafios das sociedades contemporâneas. As alianças europeias são, por tudo isto, da maior importância para o futuro das universidades portuguesas.
Opinião | In Diário de Notícias
Rui Vieira de Castro | Reitor da Universidade do Minho